“Caro amigo gay,
Sei que em muitas partes sofremos com as mesmas dores. O abandono da família, o medo de andar na rua de mãos dadas com quem amamos, os olhares preconceituosos e as perguntas constrangedoras e íntimas.
Mas ainda vivemos realidades distintas, separadas por nossos corpos e por nossos papéis sociais. Nós não somos iguais e é muito importante que isso seja dito.
O nosso movimento, que por muitos, ainda é conhecido como ‘gay’, assim como a bandeira, o mês, todo esse "privilégio" alcançado por vocês, acho que a socialização, juntamente com o machismo, fez com que vocês fossem figuras mais aceitas. Mas não, isso não é culpa de vocês.
O que é culpa de vocês são alguns comportamentos reproduzidos a partir dessa ‘ascensão’, um sexismo camuflado com ‘brincadeiras’ que nos ferem diretamente. Ainda que gays, vocês são homens.
Não, não é porque tenho um corpo que não te atrai que você pode insultá-lo e dizer sentir repulsa dele, porque isso é misoginia. E também não é por isso que você pode me assediar, tocar em mim como se fosse uma ‘brincadeira’ em que todos estão se divertindo.
Não, você não tem o direito de classificar o que é uma mulher lésbica ou bissexual. Querido, sei que você ficou confuso, mas eu explico. Em diversos momentos, ouvi homens gays dizendo “ah, mas ela nem parece lésbica” ou “eu não acho bonito lésbicas mais femininas, não parece de verdade” e ainda frases bifóbicas como “ah, mas ela é bi, não lésbica, vai trocar a fulana por um homem, certeza”. A sexualidade de uma mulher independe do seu critério estético, querido, não se esqueça disso. Sua função aqui é conviver e respeitar essa mulher, não questioná-la.
Não me interrompa quando eu falo, não explique por mim, não menospreze o que estou sentindo e nem me trate como se meu mundo girasse ao seu redor. Lembre-se, por mais que parecidas, nossas dores divergem. Se quer, de fato, me ajudar, me dê ouvidos, porque eu não tenho voz. Quero que você me ouça e me respeite. Usa seu privilégio para me colocar onde ainda não posso estar e se questione o porquê você pode estar e eu não.
Obrigada pela atenção.
- Sua amiga sáfica”
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