Editora Vira Letra e a literatura lésbica


Quando falamos sobre literatura, um universo se abre diante dos nossos olhos. No momento que abrimos um livro, somos engolidas por emoções que não são nossas, nos apaixonamos e odiamos personagens que não existem da forma mais gostosa que há, sem sair de nossos cantinhos de leitura. E, especificamente sobre literatura lésbica, esse espaço fica muito mais próximo de nós, porque entendemos de forma intrínseca cada uma dessas personagens que são como eu e você. Como elas amam e sofrem.

E, pensando nisso, a editora Vira Letra surge no início de 2014, em Franca, no interior de São Paulo. Idealizada por Manuela Neves, a editora nasce da vontade de publicar a tese de graduação da própria mãe. “O primeiro livro foi ‘Simplesmente Mãe’, que conta sobre o processo de aceitação de uma mãe em relação à homossexualidade da filha. É a tese da minha mãe”, explica.

Manuela, formada em Editoração pela Universidade de São Paulo (USP), conta que, no começo, os livros eram produzidos de forma artesanal e que, em seus primeiros passos como empreendedora, a família toda ajudou. "A primeira prensa que tive, foi meu pai quem fez.  Eu precisava de uma guilhotina para cortar, e minha esposa recebeu um dinheiro e me deu; meu irmão desenhou as prensas seguintes, que foram mais elaboradas e, claro, minha mãe sempre me apoiou em todo o processo”. Embora esse tenha sido o pontapé inicial, ela conta que a ideia de empreender nesse ramo sempre foi um sonho. “Eu queria ter minha própria editora para publicar livros LGBT”, completa.

Manuela diz que para viabilizar o processo de produção dos livros no início, ela desenvolveu, depois de muito estudo, uma técnica artesanal para fazer os livros, deixando-os idênticos aos produzidos industrialmente. “No primeiro ano, ao todo, foram cinco livros publicados no (com tiragens artesanais que iam de 100 a 300 exemplares)”, explica. Porém, graças ao crescimento exponencial da Vira Letra, o processo artesanal estava gerando um atraso incompatível com a demanda. Dos cinco livros lançados no primeiro ano, três deles tiveram uma segunda edição impressa em gráfica industrial, com uma tiragem maior.

“Eu sempre falo que o livro tem que ser publicado de um jeito que a autora ame. Por exemplo, ela tem que amar a capa, a diagramação, aprovar todas as revisões, etc. E o momento que sempre me deixa extremamente feliz é quando elas pegam um livro novo nas mãos pela primeira vez”, assente.


Quando fala sobre o começo, a empreendedora não esquece de agradecer às escritoras Diedra Roiz e Wind Rose, que, segundo Manuela, “toparam entrar na loucura junto com ela”.

A editora é uma MEI, por isso não pode contratar funcionários, mas isso não significa que Manuela faça todo o trabalho sozinha, já que conta com a ajuda e divulgação das próprias escritoras no processo de finalização e divulgação dos livros. “Gosto de pensar que, apesar de oficialmente a editora ser minha, nós somos uma equipe em conjunto - e isso funciona. Cada autora incentiva a outra, mesmo quando não tem nada a ver com o livro sendo lançado. Somos uma equipe mesmo”.

Ao longo desses quase oito anos, a Vira Letra já publicou cerca de 30 livros na temática de literatura lésbica, assim como uma coletânea de contos (15 contos com temática lésbica, escritos por 15 mulheres lésbicas, que mostra a pluralidade do ser mulher e ser lésbica) chamada “[in]contadas”, que teve distribuição gratuita. Entre as autoras já publicadas estão Diedra Roiz, Wind Rose, Lis Selwyn, Karina Dias, Hanna K., Priscila Cruz, Melina Navarro, Cristina Perin e Raquel Gomes.

Questionada sobre o que diria para ela mesma, antes disso tudo, de fazer a Vira Letra real,  Manuela se emociona ao dizer que “eu nunca, nem nos meus melhores e maiores sonhos, imaginaria que um dia eu teria uma editora de literatura lésbica e publicaria as minhas autoras favoritas. A Manuela de 13 anos (de quando eu descobri a literatura lésbica) não acreditaria e mesmo depois, quando eu comecei a editora, eu nunca imaginei que ela chegaria onde está. Eu sabia que a literatura lésbica tinha um poder transformador (afinal, foi assim pra mim), mas eu nunca poderia imaginar que eu faria parte disso”, conclui.

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